Marcos Barbosa, um dos mais promissores dramaturgos brasileiros contemporâneos, cujas peças foram produzidas não apenas nos Estados Unidos como também em diversos países da Europa, escreveu o texto dramatúrgico Auto de Angicos(2003) a partir de uma solicitação da diretora baiana Elisa Mendes. Auto de Angicos,que recebeu o prêmio ―Braskem de Melhor Texto‖ em 2004, é uma peça que remete ao casal de cangaceiros Lampião e Maria Bonita momentos antes de serem dizimados no Grotão de Angicos. Barbosa demonstra em seu texto que o relacionamento íntimo do casal é recheado de gentilezas, alegrias, desapontamentos e perdas, como ocorre nos relacionamentos de tantos outros casais. O dramaturgo cearense dissocia a imagem de Lampião, geralmente ligada a confrontos violentos, ao escolher como cenário o Grotão de Angicos tal qual a ―sala de uma casa‖. Auto de Angicosteve duas produções: uma da diretora Elisa Mendes, em 2003, e outra do diretor mineiro Amir Haddad, em 2008. A proposta deste trabalho centraliza-se na análise da peça nos seus aspectos textuais e espetaculares a partir de contextos históricos, estéticos e filosóficos, o que possibilitou um embasamento teórico maisabrangente para a discussão da dissolução das antinomias e a discussão da importância do corpo no teatro contemporâneo. A peça se insere no panorama do teatro brasileiro atualnão só por apresentar pela primeira vez no palco a personagem Lampião destituída das polaridades, que ora o apresentam como um herói, ora como vilão, bem como pela priorização da produção de presença na montagem de Haddad. Tal priorização busca desnudar os artifícios geradores da ilusão dramática através da estética brechtiana e da utilização de elementos do teatro de rua. Os atores realizam um jogo performático que conduz o público, através da personagem de Lampião, ao âmago do questionamento sobre as diversas faces do ser humano.